Tiago Piassum analisa o impacto da tokenização no agronegócio, evidenciando seu potencial para transformar a gestão de ativos 

Tiago Piassum, Founder da Rivool Finance

A tokenização, processo de conversão de direitos sobre um ativo em um token digital em uma blockchain, vem impactando diversas áreas da economia global, e o agronegócio é um dos setores mais promissores para sua aplicação.

Essa inovação tecnológica permite uma facilidade ao acesso ao investimento em ativos agrícolas, oferecendo uma maneira eficiente e segura de representar a propriedade de partes de um ativo por meio da tecnologia blockchain. O seu impacto potencial no agronegócio é vasto, prometendo transformar as práticas tradicionais de financiamento, gestão de ativos e cadeias de suprimentos, tornando-as mais inclusivas, líquidas e transparentes.

Uma das possibilidades de sua aplicação é na produção agrícola. A tokenização permite aumentar a liquidez de ativos agrícolas, tornando-os mais facilmente negociáveis e acessíveis a um espectro mais amplo de investidores. Isso não somente amplia o acesso ao capital para o setor, mas também oferece aos agricultores opções mais flexíveis para gerenciar e financiar suas operações.

Ademais, promove a transparência e a rastreabilidade dos produtos, desde a origem até o consumidor final, aumentando a confiança no mercado.

Os registros imutáveis em blockchain garantem a autenticidade das informações sobre os produtos, como qualidade, quantidade e sustentabilidade das práticas agrícolas, agregando valor à produção. Por exemplo, agricultores, que historicamente estavam limitados a vender suas colheitas para tradings e assinar contratos de liquidação de grãos com preços inferiores aos observados na data de entrega, ou que optavam por mantê-las em silos em seus campos, agora têm uma nova opção. Com a tokenização eles podem entregar sua colheita e transformar cada tonelada de grão em um token, identificado de forma única na blockchain, que os produtores podem vender no momento em que precisarem, pelo preço atualizado, diretamente no mercado.

Outro aspecto revolucionário da tokenização é a promoção de maior liquidez e transparência no agronegócio. Tradicionalmente, ativos como terras agrícolas ou produção agropecuária possuem pouca liquidez, dificultando sua compra e venda rápida.

A tokenização, ao facilitar a divisibilidade e a transferência digital de propriedade, introduz uma nova camada de liquidez ao mercado. Essa transformação permite que proprietários de ativos e investidores realizem transações de maneira mais ágil e com custos de transação reduzidos. Isso inclui custos relacionados a intermediários, honorários advocatícios e despesas administrativas.

Além disso, a natureza imutável do registro em blockchain assegura a integridade e a transparência das transações, garantindo uma maior confiança entre as partes envolvidas e contribuindo para um ambiente de negócios mais seguro e eficiente no agronegócio.

Ainda que atue em uma pequena fração no agronegócio mundial, a tokenização no agronegócio possui projetos pioneiros que já apresentam bons resultados. Cabe citar o projeto "Agrocoin" no México, que permitiu a indivíduos investir na produção de pimenta habanero através da compra de tokens que representavam uma área física de terra cultivável; e o projeto “Agrotoken”, que vem tokenizando a produção de soja e trigo na Argentina e agora busca fazer o mesmo no Brasil.

Esses são apenas alguns exemplos que sublinham a versatilidade da tokenização no agronegócio, que vão desde o fornecimento de oportunidades de investimento inovadoras até criar plataformas educacionais que mesclam atividades econômicas virtuais e reais. Todavia, a aplicação mais promissora da tokenização no agronegócio provavelmente estará no mercado de crédito.

Isto porque uma das principais vantagens da tokenização no agronegócio é a facilidade do acesso ao capital. Através da emissão de tokens representativos de ativos agrícolas, pequenos e médios investidores podem participar de oportunidades de investimento anteriormente acessíveis apenas a grandes investidores ou instituições financeiras.

Isso não apenas amplia o leque de opções para investidores, mas também fornece aos proprietários de ativos agrícolas de todos os portes uma alternativa viável para captar recursos, potencializando a injeção de capital novo e diversificado no setor, inclusive capital externo.

Além disso, a tokenização facilita a divisão de ativos em partes menores, tornando possível o seu uso fracionado como colateral para a obtenção de recursos e também o investimento em frações de propriedades, o que reduz significativamente a barreira de entrada para participação no mercado agrícola.

Um exemplo disso é a introdução do padrão ERC-3643, uma evolução significativa na tecnologia blockchain para a tokenização de ativos reais, oferece um avanço notável na maneira como ativos agrícolas podem ser financiados e investidos.

Para entender essa inovação, é essencial conhecer o conceito de smart contracts, ou contratos inteligentes, que são programas autoexecutáveis armazenados na blockchain. O ERC-3643, que se baseia no sucesso do padrão ERC-20 – o primeiro padrão amplamente adotado para a criação de tokens em Ethereum, proporcionando flexibilidade, mas com limitações em conformidade e segurança – amplia essa tecnologia ao incorporar camadas adicionais de verificação e controle.

Isso garante que cada transação atenda a rigorosos requisitos regulatórios, abrindo portas para uma tokenização segura e regulamentada no setor agrícola. Um exemplo prático seria uma fazenda de café no Brasil utilizando o ERC-3643 para tokenizar uma fração de sua produção futura. Essa abordagem não só facilita o acesso ao capital necessário para expansão e melhorias na infraestrutura, como também oferece aos investidores a oportunidade de participar diretamente no sucesso da safra, tudo isso dentro de um quadro regulatório claro e seguro. Assim, o ERC-3643 representa um marco na união entre inovação tecnológica e pragmatismo regulatório, possibilitando uma nova era de investimento e gestão financeira no agronegócio.

Portanto, a tokenização no mercado de crédito para o agronegócio é capaz de melhorar a eficiência, acessibilidade, transparência e liquidez, ao mesmo tempo em que reduz os custos associados aos instrumentos de crédito tradicionais.

Em suma, a tokenização no agronegócio representa um marco na inovação financeira, permitindo o acesso ao investimento e oferecendo transparência e liquidez inéditas. À medida que avança, é plausível prever que o desenvolvimento tecnológico e as mudanças regulatórias ampliarão ainda mais as fronteiras do que hoje se observa.

A integração de novas tecnologias blockchain promete aprimorar a segurança e a eficiência das transações, enquanto ajustes na legislação deverão oferecer um terreno mais fértil para o crescimento sustentável dessas iniciativas. Desse modo, é possível vislumbrar um futuro em que a tokenização não apenas transforme o mercado de crédito e a gestão de ativos no agronegócio, mas também estimule uma maior inclusão econômica e promova práticas agrícolas sustentáveis. Este cenário futuro, impulsionado por uma combinação de avanços tecnológicos e suporte regulatório, promete solidificar o papel revolucionário da tokenização no agronegócio.